Autonomia municipal no licenciamento ambiental
"Não precisamos de autorização do Estado!"
Recentemente fui surpreendido com a notícia de que o Conselho Estadual de Meio Ambiente de Espírito Santo (Consema) autorizou os Conselhos Regionais de Meio Ambiente (Conremas) a delegar competência aos municípios para o licenciamento ambiental. Os Conremas poderão avaliar a solicitação dos municípios que pretendem realizar o licenciamento de atividades ou empreendimentos que não estão previstos na Resolução 001/2007 do Consema.
O que me causa estranheza é a passividade dos municípios capixabas em aceitar as regras impositivas do Estado, ferindo a autonomia daqueles entes e a própria Constituição Federal. Sabe-se que a Constituição atribuiu aos municípios brasileiros autonomia e competência para o exercício do poder de polícia em diversas matérias, inclusive na proteção do meio ambiente, a exemplo do licenciamento ambiental. Por que, então, os municípios precisam de delegação dos órgãos estaduais, se o licenciamento ambiental de impacto local já é atribuição originária do município?
Quando fui assessor da Secretaria de Planejamento, Urbanismo e Meio Ambiente do Município de Salvador enfrentamos problema semelhante. Salvador nunca teve um órgão atuante na área ambiental, por isso, o licenciamento ambiental local era feito pelo órgão ambiental do Estado da Bahia. Com a criação da Superintendência Municipal do Meio Ambiente, em 2005, e de uma Gerência de Licenciamento Ambiental, o município começou a dar seus primeiros passos para o exercício licenciatório.
O licenciamento ambiental de alguns empreendimentos locais já estava sendo tocado quando o Estado propôs a celebração de um convênio delegando à Prefeitura outros de impacto local. Tivemos, naquela época, a lucidez de saber dizer ao Estado que, a partir da criação de um órgão ambiental próprio, com um setor especializado no assunto, estava, portanto, o Município, apto a realizar o licenciamento ambiental para empreendimentos e atividades de impacto local. Não seria cabível, assim, celebração de qualquer convênio daquela natureza.
Alertamos ainda que, se houvesse necessidade de celebrar convênio, o pólo das iniciativas deveria ser invertido, ou seja, levando-se em consideração a presunção de que tudo que estiver no Município é de impacto local, salvo uns e outros de impacto regional, ou até mesmo federal, caber-lhe-ia apontar quais seriam os empreendimentos ou atividades cujo licenciamento ambiental não seriam realizados pela Prefeitura. Assim, a proposta de convênio deveria partir do Município, e não, como ocorreu, do Estado.
Acredito que esta experiência possa ser replicada no caso do Espírito Santo; os municípios capixabas precisam se movimentar para fazer valer a Constituição, não sendo necessário aguardar deliberação dos órgãos estaduais para prevalecer sua autonomia. Podem sim licenciar e devem iniciar já a montagem da estrutura administrativa necessária para tal mister. O Estado pode fazer a sua parte como parceiro na proteção do meio ambiente, emprestando recursos humanos e materiais que possibilitem o exercício do licenciamento ambiental pelos entes locais. Aí sim o convênio se torna necessário e é bem vindo.
Em suma, o consenso hoje é de que os municípios devem atuar prioritariamente sobre tudo que seja de sua alçada, ficando a cargo dos Estados e da União o que o governo local não possa cumprir de maneira eficiente.