Sunday, March 09, 2008

Perspectivas para Kioto e pós-Kioto

Perunta-se, como as incertezas científicas em relação às mudanças climáticas provocadas pela ação humana poderão influenciar as novas decisões para 2008-2012 e para pós-Kioto?
A Contribuição do Grupo de Trabalho I ao Quarto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima aponta, em diversas passagens, que as mudanças climáticas que estamos experimentando neste início de Século XXI são, muito provavelmente, fruto da mão do homem pós-Revolução Industrial.
Vale a pena transcrever trechos que mostram esses quase sofismas:
“A principal fonte de aumento da concentração atmosférica de dióxido de carbono desde o período pré-industrial se deve ao uso de combustíveis fósseis e mudanças no uso da terra. Essas últimas formas de emissão, entretanto, ainda apresentam uma grande incerteza”.
“É muito provável que o aumento observado da concentração de metano se deva às atividades antrópicas, predominantemente a agricultura e o uso de combustível fósseis, mas as contribuições relativas de diferentes tipos de fontes não estão bem determinadas”.
“A compreensão das influências antrópicas no aquecimento e resfriamento do clima melhorou desde a publicação do Terceiro Relatório de Avaliação, promovendo um nível muito alto de confiança de que o efeito líquido global das atividades humanas, em média, desde 1750 foi de aquecimento”.
“Desde a publicação do Terceiro Relatório de Avaliação, foram feitos avanços na compreensão de como o clima está mudando em termos espaciais e temporais, por meio da melhoria e da ampliação dos numerosos conjuntos de dados e das análises de dados, de uma cobertura mais ampla, de uma melhor compreensão das incertezas e de uma maior variedade de medições”.
O Relatório traz ainda a Tabela SFP.2, na qual mostra a probabilidade de que alguns fenômenos naturais estejam sendo causados pela ação antrópica e a probabilidade de tendências futuras com base em projeções para este Século.
Enfim, trata-se de um Relatório, no meu entender, conclusivo: as mudanças climáticas estão de fato ocorrendo por causa da mão do homem pós-Revolução Industrial. Entretanto, este não é o entendimento (ou não quer ser) da comunidade científica. As incertezas científicas persistem; não há uma conclusão quanto ao assunto, muito menos uma certeza científica de que as mudanças climáticas que hoje presenciamos são fruto da ação antrópica.
Por isso que podemos dizer que o Protocolo de Kioto ainda “não pegou”. Temos visto a difusão do mercado de carbono em alguns países (tendo a China, Índia e o Brasil liderando a produção de créditos) e a Comunidade Européia na vanguarda da aquisição, impondo-se até mesmo níveis mais restritivos do que os convencionados em Kioto.
Caso tais incertezas não sejam superadas até o advento do Protocolo de Kioto (em 2012), dificilmente teremos tempo hábil para evitar o aquecimento global. Segundo relatório recente das Nações Unidas, se as emissões de carbono não forem substancialmente reduzidas até 2020, o aquecimento global colocará em movimento processos naturais irreversíveis.
Ou o mundo (leia-se os EUA) passa a tratar as incertezas como sofismas absolutos, confirmando a tese da maioria da comunidade científica sobre as causas das mudanças climáticas (aqui os cientistas têm papel fundamental, pois devem ter coragem para emitir relatórios mais conclusivos e enfrentar os seus colegas mais céticos), ou teremos que arriscar para ver o que acontece. Essa geração tem a oportunidade de se prevenir, ao preferir encarar as quase-conclusões dos Relatórios como conclusões absolutas.
Diante de tudo isso, resta traçarmos os seguintes cenários:
1- Considerando-se que dificilmente teremos um Relatório conclusivo antes de 2012, que rechace as incertezas geradas nos Relatórios anteriores, a opção é que os EUA entrem no jogo. Recentemente o Governo W. Bush anunciou a intenção de celebração de um acordo internacional sobre o clima até o meio desse ano;
2- Caso os instrumentos de redução das emissões de gases de efeito estufa previstos por Kioto não sejam efetivados antes de 2012, restará ao mundo adotar um novo formato de compromisso global, com metas mais ambiciosas, deveres que possam ser cobrados pelos demais países ou por um órgão internacional, instrumentos mais eficazes, contemplando não somente a redução na emissão de gases de efeito estufa, mas também a completa descarbonização da energia.