Monday, January 29, 2007

Resumo de livros 2

Continuando meu projeto de disponibilizar resumo de livros sobre Direito Ambiental e Urbanístico, está disponível a obra de Celso Antonio Pacheco Fiorillo, Estatuto da Cidade Comentado, da editora RT - Revista dos Tribunais.
Quem tiver interesse em saber um pouco sobre esta obra e a Lei 10.257/2001, basta enviar um e-mail para ambientalurbano@gmail.com e fazer sua solicitação.

Monday, January 22, 2007

Autonomia do Direito Urbanístico

Enquanto no Direito Ambiental essa questão já se encontra assentada, agora se discute a autonomia do Direito Urbanístico.
Um ramo jurídico adquire autonomia quando alcança certo grau de importância no ordenamento jurídico de forma a não depender totalmente de outras disciplinas. As novas disciplinas jurídicas têm surgido a partir do desenvolvimento de um “braço” de disciplinas maiores, como o Direito Administrativo, por exemplo; daí, adquire status tal que seu desmembramento torna-se inevitável.
Há, basicamente, dois tipos de autonomia para um ramo do Direito: a política e a acadêmica. Na primeira, verifica-se a necessidade política-sócio-econômica do seu desenvolvimento; a sociedade clama pelo seu surgimento e amadurecimento de forma a poder enfrentar determinada situação. No caso do Direito Urbanístico, sua autonomia política foi aclamada para tentar resolver o caos urbano instalado pelo crescimento desordenado das cidades. Assim, a Constituição Federal pode ser considerada o marco jurídico fundamental da autonomia política do Direito Urbanístico, ao prever, pela primeira vez na história das constituições brasileiras um capítulo exclusivo (arts. 182 e 183).
Já a acadêmica, segundo convenções internacionais, é admitida quando a disciplina preenche esses requisitos: ter objeto, princípios, institutos jurídicos e leis específicas próprios.
O Direito Urbanístico tem por objeto o ordenamento urbano, garantindo que as cidades e as propriedades urbanas cumpram sua função social, mediante as diretrizes gerais fixadas no art. 2º do Estatuto da Cidade.
O Direito Urbanístico também tem princípios próprios, tais como o da função social da cidade (garantir terra urbanizada, moradia, saneamento ambiental, infra-estrutura, serviços públicos, mobilidade urbana e acesso ao trabalho, cultura e lazer para todos os seus habitantes e passageiros), da função social da propriedade urbana (conformando a propriedade privada às regras urbanísticas) e da cidade sustentável (propiciar o desenvolvimento socialmente justo, ambientalmente equilibrado e econômica e institucionalmente viável).
Institutos jurídicos próprios são vários, desde as posturas municipais do Século XIX até os mais recentes trazidos pelo Estatuto da Cidade (operações urbanas consorciadas, preempção, solo criado, transferência do direito de construir, estudo de impacto de vizinhança, entre outros), passando por inúmeros outros presentes em municípios do país.
Quanto às leis específicas, o Estatuto da Cidade (Lei 10.257, de 10 de julho de 2001) é a principal, responsável pela regulamentação dos artigos 182 e 183 da Constituição Federal vigente.
Em minha opinião, o Direito Urbanístico já alcançou sua autonomia própria, desmembrando-se do Direito Administrativo, embora ainda dependa não somente dele como de tantos outros ramos jurídicos (Ambiental, Tributário, Civil, etc). Cabe, doravante, entender a nova ordem jurídica a partir dos requisitos do Direito Urbanístico citados acima.

Monday, January 15, 2007

Enfim, regras para definição da competência no licenciamento ambiental

Nesta terceira e última postagem seguida sobre licenciamento ambiental, destaco a interface do projeto de lei complementar que está sendo elaborado pelo Poder Executivo com o post passado (Um bom começo).
A minuta está disponível para download no site do Ministério do Meio Ambiente e pretende fixar normas para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no que se refere às competências comuns previstas nos termos do art. 23, incisos III, VI e VII e parágrafo único da Constituição Federal.
No post passado, dei minha opinião sobre os dois critérios definidores da competência licenciatória ambiental: o da titularidade da área a ser executado o empreendimento, e o do raio de influência ambiental.
Pois o projeto de lei complementar adota os dois critérios, além de outros como a natureza da atividade. Vejamos:
O art. 4º atribui à União (através dos seus órgãos federais) o licenciamento de atividades e empreendimentos:

  • que causem ou possam causar impacto ambiental direto de âmbito nacional (critério do raio de influência);
  • localizadas ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em país limítrofe (critério locacional);
  • localizados na plataforma continental, na zona econômica exclusiva, em terras indígenas ou em unidades de conservação de domínio da União (critério locacional);
  • que utilizem, em qualquer estágio, energia nuclear em qualquer de suas formas (critério da natureza da atividade);
  • empreendimentos e atividades militares (critério da natureza da atividade).

Aos Estados e ao Distrito Federal (art. 5º), meio que de forma residual, restou o licenciamento de atividades e empreendimentos que causem ou possam causar impacto ambiental direto de âmbito estadual (critério do raio de influência), e os localizados em unidades de conservação de seu domínio (critério locacional).
E aos Municípios (art. 6º) caberá, semelhantemente aos Estados, o licenciamento de atividade e empreendimento que causem ou possam causar impacto ambiental direto de âmbito municipal (critério do raio de influência), e os localizados em unidades de conservação de seu domínio (critério locacional).
O projeto define (art. 11) ainda o que se entende por impacto ambiental de âmbito nacional:

  • aquele que afete diretamente, no todo ou em parte, o território de dois ou mais Estados Federados ou cujos impactos ambientais significativos diretos ultrapassem os limites territoriais do país;
  • impacto ambiental de âmbito estadual: aquele que afete diretamente, no todo ou em parte, o território de dois ou mais Municípios;
  • impacto ambiental de âmbito local: aquele que afete diretamente, no todo ou em parte, o território de um município, sem ultrapassar o seu limite territorial.

Embora esta minuta até então apresentada tenha avançado substancialmente, modernizando o Direito Ambiental, peca, ao meu ver, em não definir princípios ou diretrizes (como o da predominância do interesse, por exemplo) que nortearão os conflitos de interesse (ou na sua falta) quando conflitos de competência licenciatória forem suscitados. Deixa, portanto, segundo arts. 9º e 10, ao CONAMA e aos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente, a tarefa de, respectivamente, dirimir conflitos desta natureza entre a União e os Estados ou Distrito Federal, ou entre estes, e entre os Estados e os Municípios, ou entre estes. E quando for diretamente entre a União e os Municípios, como no caso das barracas de praia na orla marítima de Salvador, conforme relatado no post passado? O projeto não prevê resposta para esta questão.
Vislumbra-se, portanto, que este projeto de lei complementar guarda notória semelhança com a Resolução CONAMA 237/97; talvez até propositadamente, com o objetivo de legalizá-la, face às acusações de inconstitucionalidade por parte da Doutrina nacional. É o que se vê também no art. 8º, quando diz que o licenciamento ambiental realizar-se-á por um único ente federado, rechaçando de vez os argumentos despropositados de alguns autores no sentido de admitir que o licenciamento ambiental seja elaborado por mais de um ente federado, devido à natureza da competência comum estabelecida no art. 23 da Constituição Federal, entendimento o qual nunca compartilhei.

Wednesday, January 10, 2007

Um bom começo

Recentemente, o Juiz da 13ª Vara Federal da Seção Judiciária da Bahia deu uma decisão polêmica: antecipando os efeitos da tutela de uma Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal em face do Município de Salvador, determinou que o licenciamento ambiental das barracas de praia localizadas na orla marítima da capital baiana fosse feito pelo Ibama, e não mais pela SMA – Superintendência do meio Ambiente (órgão ambiental municipal).
O argumento utilizado pelo parquet federal e acolhido pelo magistrado foi o da titularidade da área onde será realizada a atividade ou obra, i. e., quando localizados em terreno de propriedade da União (praias marítimas), incumbe ao órgão federal do meio ambiente o licenciamento ambiental. Deixou, portanto, de apreciar a competência funcional com base no critério do raio de influência ambiental, que indicará o interesse gerador da fixação da atribuição[1], adotado majoritariamente pela doutrina atual.
Cabe esclarecer que este critério deve ser analisado, ainda, levando-se em consideração a preponderância do interesse. No caso concreto, instalação de barracas de praia na orla marítima de Salvador, interessa mais a quem?, à União, ao Estado ou ao Município? Esta não é uma pergunta difícil de responder, pois se sabe que a cultura de barracas de praia vem de longa data, já impregnada no gosto popular dos soteropolitanos.
Entretanto, não se pode impedir que a União (Ibama + Gerência do Patrimônio da União), e também o Estado, participem do processo licenciatório, até mesmo para dar maior credibilidade e transparência aos estudos ambientais, além de se evitar a instalação dos referidos equipamentos (que têm se mostrado verdadeiras urbanizações) na faixa de areia das praias.
Desta forma, ressalto que meu manifesto é meramente quanto à decisão do Juiz, no sentido de acolher o critério da titularidade da área a sofrer alteração na definição da competência licenciatório ambiental, ao qual me oponho. Em minha opinião, o critério que deveria ser levado em consideração é o do raio de influência do dano ambiental gerado, atentando-se para a preponderância do interesse.
Faço questão de externar, contudo, que sou contrário à instalação das barracas de praia conforme estão sendo construídas pela Prefeitura. Mudando-se o projeto, subindo as barracas para o nível das calçadas e desocupando-se as faixas de areia, aí sim o diálogo pode ser iniciado.
Não obstante polêmica, a decisão merece aplausos; trata-se de um bom começo para uma discussão saudável e um fim, quiçá, melhor ainda, pois há que lembrar que se trata de uma decisão provisória, que ainda pode ser revertida, no mérito, conforme o próprio magistrado reconheceu.

[1] Hamilton Alonso Jr. Aspectos Jurídicos do Licenciamento Ambiental. 3a. Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 50/51.

Wednesday, January 03, 2007

Licenciamento Ambiental Municipal

Não tenho dúvidas quanto à brecha que a Constituição Federal (CF) abriu para que o licenciamento ambiental possa ser realizado pelas três esferas do governo (União, Estados/DF e Municípios), senão vejamos: o seu art. 23, VI estatui que “é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas”.
Mais claro do que isso não poderia ser. O problema que alguns doutrinadores chamam a atenção é para o fato de que, anterior à CF, existe a Lei 6.938/81 que, no seu art. 10, diz que o licenciamento ambiental compete aos órgãos estaduais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA, e ao IBAMA em caráter supletivo. Sequer citava os municípios.
Ora, sabe-se que a Constituição Federal é a supremacia em hierarquia legislativa no país, não podendo Lei Ordinária dispor diferente dela, sob pena de inconstitucionalidade ou não-recepção. A CF veio incluir os municípios no âmbito da competência para licenciar.
Regulamentando o assunto, que se encontrava vago, o CONAMA editou a Resolução nº 237/97. Com efeito, no art. 4º encontram-se elencadas as situações em que o órgão federal (IBAMA) é competente para licenciar; no 5º estão as ocasiões que competem aos órgãos ambientais dos Estados e do Distrito Federal e no 6º temos que “Compete ao órgão ambiental municipal, ouvidos os órgãos competentes da União, dos Estados e do Distrito Federal, quando couber, o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades de impacto ambiental local e daquelas que lhe forem delegadas pelo Estado por instrumento legal ou convênio”.
Portanto, resta claro que os Municípios têm competência (atribuída pela Carta Magna, ressalte-se) para exercerem o licenciamento ambiental. Entretanto, essa competência restringir-se-á aos empreendimentos e atividades de impacto ambiental local, conforme determinado pelo art. 6º da Resolução 237/97 do CONAMA.
Portanto, desde que o interesse local fique restrito àquele município, seu respectivo órgão ambiental será o competente para exercer o licenciamento. Por outro lado, se os possíveis ou efetivos impactos deste determinado empreendimento ou atividade trouxerem risco a mais de um município, neste caso, o órgão estadual será o competente.
É importante ressaltar também que, como diz Hamilton Alonso Júnior (in Aspectos Jurídicos do Licenciamento Ambiental, 3ª Ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004) “não é fator decisivo estar o empreendimento dentro dos limites de determinada cidade, pouco importando, ainda, a titularidade da área onde será realizada a atividade e/ou obra. O raio de influência ambiental é que indicará o interesse gerador da fixação da atribuição, traçando-se uma identificação da competência licenciadora com a competência jurisdicional (art. 2º da Lei Federal nº 7.347/85 – local do dano ambiental)”.
Este texto é uma versão resumida de um dos capítulos do artigo “Aspectos Polêmicos do Licenciamento Ambiental”, publicado na Revista Fórum de Direito Urbano e Ambiental, Ed. Fórum: Belo Horizonte, vol. 25, jan. e fev. 2006 e disponível em diversos sites na internet.